Sandro Fantinel foi condenado ao pagamento de danos morais coletivos após falas discriminatórias contra trabalhadores baianos
A Justiça Federal condenou o vereador Sandro Fantinel (PL), de Caxias do Sul (RS), ao pagamento de R$ 100 mil por danos morais coletivos devido a manifestações xenofóbicas e discriminatórias contra a população nordestina, especialmente contra trabalhadores baianos. A decisão atende a ações civis públicas diversas ajuizadas pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP-RS) e sete entidades da sociedade civil.
Em 22 de fevereiro de 2023, operação conjunta realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF) resgatou mais de 200 pessoas em condições análogas à escravidão na colheita da uva em Bento Gonçalves, com grande repercussão na mídia nacional. Dias depois, em 28 de fevereiro, Fantinel usou a tribuna para emitir um discurso de caráter xenofóbico e discriminatório em relação à origem geográfica, em especial à população que nasceu ou vive no estado da Bahia, durante sessão da Câmara Municipal de Caxias.
A sentença da Justiça Federal foi dada conjuntamente em resposta a ações civis públicas ajuizadas pelo MPF, MP-RS e pelas seguintes entidades: Educafro Brasil – Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes; Centro Santo Dias de Direitos Humanos; Instituto de Advocacia Racial e Ambiental – Iara; Associação Cultural Sawabona Shikoba; Federação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Rio Grande do Sul – FACRQ/RS; Associação Cultural Raízes D’África Mundi; e Casa Africana Reino de Oxalá. A mobilização dessas entidades demonstra a gravidade e o impacto coletivo das declarações do parlamentar.
No texto da sua ação, o MPF analisa os atos discriminatórios praticados pelo réu sob o prisma do racismo estrutural existente no país. “As ideias manifestadas pelo vereador compõem o pensamento de parcela significativa da população local, o que não exime o réu de culpa, mas ao contrário, a agrava por ser um representante eleito que deveria servir de exemplo de cidadania”, reforça o texto da decisão judicial.
Conforme destaca o procurador da República Fabiano de Moraes em seus argumentos no texto da ação, “o livre exercício da liberdade de manifestação do pensamento não constitui permissão ao discurso de ódio ou à verbalização de ideias discriminatórias”. Segundo o procurador, ao reduzir o povo e a cultura da Bahia a “bater tambor, ir à praia e carnaval”, Fantinel não apenas perpetuou estereótipos preconceituosos, mas também produziu uma nova agressão simbólica aos trabalhadores baianos, “ao considerá-los como os reais responsáveis pela situação degradante em que se encontravam”.
Segundo frisa o MPF, o vereador ignorou o fato de que as pessoas resgatadas pelos órgãos de fiscalização do trabalho eram mantidas no local contra a vontade, submetidas a jornadas exaustivas, com alimentação inadequada para consumo e com relatos, inclusive, de tortura com armas de choque e spray de pimenta. Apesar disso, o réu insinuou que as condições em que foram encontrados os trabalhadores seriam “normais” na Serra Gaúcha e que “eles queriam trabalhar 15 dias e ganhar por 60”.
“O discurso do réu influencia e sugere atitudes preconceituosas e xenofóbicas, legitimando empregadores locais a pensar que não necessitam dar condições adequadas de trabalho”, destacou a sentença judicial que condenou o vereador.
O valor de R$ 100 mil será destinado a um fundo público voltado a ações coletivas, com gestão compartilhada entre conselhos, Ministério Público e representantes da sociedade. Os bens do vereador já estavam bloqueados por decisão judicial anterior. Como se trata de sentença em 1º grau, ainda cabe recurso à instância superior.
Ação Civil Pública nº 5002539-15.2023.4.04.7107/RS
Fonte: Ministério Público Federal