Dois homens são condenados por crimes de injúria racial e tortura a funcionários de uma loja em Salvador 

O Juízo da 11ª Vara Criminal da Comarca de Salvador condenou dois homens pelos crimes de injúria racial e de tortura praticados contra W.J.C. e M.E.S.S. nos dias 19 e 22 de agosto de 2022, em uma loja de variedades na Avenida Joana Angélica, no Centro de Salvador, onde trabalhavam. Os réus exerciam as funções de proprietário e gerente no respectivo estabelecimento. 

Conforme o inciso II, artigo 1º, da Lei 9.455/97, constitui crime de tortura – sujeito a pena de reclusão de 2 a 8 anos – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.  

De acordo com a denúncia, os réus, valendo-se de suas condições de empregadores, submeteram os ofendidos (seus subordinados) a intensos sofrimentos físicos e mentais e a humilhações. E que as torturas realizadas tiveram o objetivo de punir as vítimas com a finalidade de obter das mesmas as confissões de que teriam furtado mercadorias e dinheiro do estabelecimento. Além disso, considerando ser a vítima W.J.C. uma pessoa negra, o acusado se valeu de elementos atinentes à raça para ofender a dignidade.  

A decisão levou em consideração, entre outros, o relatório médico confirmando as lesões nas vítimas. Cabe recurso. 

Penas – Os réus foram condenados, em razão do crime de tortura praticado contra a vítima W.J.C., a oito anos e seis meses de reclusão. Em relação a M.E.S.S., foram condenados a seis anos de reclusão. Um dos réus foi condenado, também, a quatro anos e seis meses de reclusão, além de multa, pela prática do crime de injúria racial. As penas devem ser cumpridas, inicialmente, em regime fechado. 

Além disso, cada um dos sentenciados foi condenado a indenizar a vítima W.J.C em 20 salários mínimos e a vítima M.E.S.S em 10 salários mínimos, a título de reparação dos danos estéticos, psicológicos e morais causados às mesmas. 

Fonte: Tribunal de Justiça da Bahia

Rede varejista é condenada por contratar temporários para funções permanentes

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST rejeitou o recurso da Arthur Lundgren Tecidos S.A. (Casas Pernambucanas), condenada a pagar indenização por danos morais coletivos de R$ 100 mil por contratar trabalhadores temporários fora da previsão legal. Para o TST, a desobediência à legislação trabalhista atinge a sociedade como um todo.

Rede contratava temporários para funções permanentes

O trabalho temporário é regido pela Lei 6.019/1974 e se destina a atender à necessidade transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços.

Na ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) informou que a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo autuou a empresa em setembro de 2011, porque os trabalhadores temporários eram contratados para atender serviços permanentes e previsíveis. A Auditoria Fiscal do Trabalho apurou, na época, 3.140 trabalhadores em situação irregular. 

Conforme o relatório, a empresa anunciava vagas, recebia documentação, fazia entrevistas e, depois, encaminhava as pessoas às empresas de trabalho temporário. Entre outubro de 2010 e março de 2013, 10.923 temporários foram contratados como auxiliares operacionais, de vendas, administrativos, de berçário e de produtos financeiros, promotores de cartão, conferentes e operadores de telemarketing. Os contratos, além de isentá-los do controle de horário, não estabelecia prazos.

O juízo de primeiro grau determinou que a empresa registrasse todas as pessoas que prestavam serviços habituais, mas negou a condenação por dano moral coletivo. 

Irregularidade resultou em precarização do trabalho 

No recurso de revista ao TST, o MPT argumentou que a conduta da empresa de frustrar direitos trabalhistas foi deliberada, com o objetivo de obter vantagem indevida frente à concorrência varejista. 

A Segunda Turma do TST acolheu o argumento, entendendo que a desobediência à legislação trabalhista atingiu a sociedade, em razão da precarização das relações de trabalho. Lembrou, ainda, que a medida causou prejuízo a esses trabalhadores, lesados quanto ao valor de suas verbas rescisórias e de outros direitos. Com isso, fixou a indenização por dano moral coletivo em R$ 100 mil.

As Casas Pernambucanas tentaram rediscutir o caso na SDI-1, alegando que a Turma teria reexaminado fatos e provas para condená-la, contrariando a Súmula 126 do TST. Mas, segundo o relator, ministro Evandro Valadão, a Turma do TST deu novo enquadramento jurídico aos fatos registrados pelo TRT e concluiu que a desobediência do empregador à legislação trabalhista “atinge à sociedade como um todo”. Dessa forma, não houve o revolvimento do conjunto probatório dos autos.

A decisão foi unânime.

Processo: Ag-Emb-Ag-ARR-2363-98.2015.5.02.0083 

Tribunal Superior do Trabalho

Empresas são responsabilizadas por morte de trabalhador em acidente em estrada

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Lemcon do Brasil Ltda. e a Nokia Solutions and Networks do Brasil Telecomunicações Ltda. a pagar R$ 300 mil de indenização à família de um ex-empregado que morreu em acidente de carro enquanto se deslocava a trabalho. Para o colegiado, a necessidade de viagens constantes expunha o trabalhador a risco.

Trabalhador se deslocava diariamente entre cidades de estados diferentes 

O trabalhador foi contratado pela Lemcon para fazer manutenção e reparo de redes e sistemas de telecomunicação da Nokia em cidades de diferentes estados, o que exigia constantes deslocamentos na rotina de trabalho. Durante uma dessas viagens, entre o Distrito Federal e o Tocantins, ele sofreu um acidente automobilístico que resultou em sua morte, aos 30 anos de idade. 

Na reclamação trabalhista, a viúva relatou que ele tinha saído de Brasília às 8h da manhã, e o acidente ocorreu por volta das 18h30. Argumentou, assim, que ele vinha dirigindo ininterruptamente por mais de dez horas para chegar ao local onde prestaria serviços. Ela pediu o reconhecimento da responsabilidade das empresas pelo acidente de percurso e uma indenização por dano moral para si e para o filho, na época com seis anos. 

O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) manteve a decisão de primeira instância que negou os pedidos. Segundo o TRT, o acidente não foi causado por condições perigosas de trabalho, mas ocorreu durante o deslocamento para o trabalho e resultou de uma fatalidade.

Deslocamentos aumentavam exposição ao risco

Ao analisar o recurso de revista da viúva, a ministra relatora Maria Helena Mallmmann entendeu que havia nexo de causalidade entre as atividades profissionais desenvolvidas, o deslocamento diário e o acidente de percurso. Para a relatora, essa rotina expunha o trabalhador a riscos maiores do que, normalmente, estão expostos outros empregados, justificando a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva.

Filho irá crescer sem a presença do pai 

A magistrada destacou ainda que o dano moral era evidente, considerando a gravidade da perda, a idade da vítima e o impacto de sua morte na vida do filho menor. “Não há dúvidas de que essa situação abalou o bem-estar da família, afetando o equilíbrio psicológico e emocional, principalmente do filho, que irá crescer sem a presença do pai”, ressaltou.

Por decisão unânime, a Turma deferiu o pedido de indenização no valor de R$ 300 mil reais e o pagamento de uma pensão mensal, com base no valor da média salarial dos últimos 12 meses do empregado, que será paga ao filho a partir da data do óbito (fevereiro de 2008) até que ele complete 25 anos de idade

(Andrea Magalhães/CF)

Processo: RRAg 77900-54.2009.5.01.0046

Tribunal Superior do Trabalho

Clínica psiquiátrica vai indenizar vigia que sofreu queimaduras ao buscar paciente em surto

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Clínica Neuro Psiquiátrica de Alfenas Ltda., de Alfenas (MG), a indenizar um vigia que sofreu queimaduras graves ao tentar resgatar um paciente em surto. Embora a atividade da clínica, em si, não se caracterize como de risco, ela pressupõe a existência de risco potencial à integridade física de seus empregados, como ocorreu no caso.

Vigia sofreu queimaduras em 30% do corpo
O trabalhador foi contratado em junho de 2021 como vigia de pátio da clínica e dispensado dois anos depois. Em novembro de 2021, ele foi destacado para, junto com outros funcionários, buscar um paciente que precisava de tratamento e acompanhamento psicológico. Quando a equipe chegou, o paciente fugiu para dentro de casa, espalhou gasolina e ateou fogo. Ao ir em sua direção, o vigia caiu sobre a gasolina em chamas e sofreu queimaduras nas mãos, nos braços, na face, nas orelhas, nas costas, no tórax e no abdome, atingindo mais de 30% do corpo. Na ação, ele pediu indenização por danos morais e estéticos.

Em sua defesa, a clínica alegou que o vigia tinha sido imprudente ao entrar na residência onde alguém já tinha ateado fogo. Seu argumento foi o de que não tinha responsabilidade pelo ocorrido, porque toda a ação que gerou o dano partiu de um terceiro estranho à relação de trabalho.

Para TRT, evento era imprevisível
O juízo de primeiro grau deferiu indenização de R$ 30 mil por danos morais e de R$ 20 mil por danos estéticos, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) afastou a condenação, acolhendo a tese do fato de terceiro. Segundo o TRT, não ficou demonstrado o descumprimento de nenhuma norma de segurança pela empregadora nem a falta de algum cuidado que poderia ter evitado o acidente. “Nas circunstâncias descritas no boletim de ocorrência, o infortúnio era absolutamente inesperado, imprevisível”, concluiu.

Atividade representa risco à integridade física dos empregados
O desembargador convocado José Pedro de Camargo, relator do recurso de revista do trabalhador, explicou que é possível aplicar a teoria da responsabilidade objetiva (que não exige a comprovação de culpa do empregador) quando se trata de atividade de risco. “No caso, ainda que a atividade econômica desenvolvida pela clínica psiquiátrica não permita concluir, à primeira vista, que é ela de risco, é certo dizer que a atividade exercida pelo vigia (busca de paciente em surto psiquiátrico) pressupõe a existência de risco potencial à integridade física dos empregados encarregados dessa tarefa”, assinalou.

Outro aspecto considerado foi que a clínica designou o empregado para uma função alheia à sua capacidade de trabalho, sem treinamento, “expondo-o a risco exacerbado por ele não imaginado e sem preparo para enfrentá-lo”. Ao afastar a tese do fato de terceiro, o desembargador acrescentou que a ação danosa do paciente psiquiátrico não é estranha à atividade para a qual o vigia foi designado.

Holding deve indenizar em R$ 289 mil, piloto de avião que deixou emprego por promessa de contratação não cumprida

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação da holding Aguassanta Participações S.A. ao pagamento de R$ 289 mil de indenização por dano moral a um piloto de avião que deixou seu emprego anterior acreditando em uma promessa de contratação que não se concretizou. A decisão, relatada pelo ministro Dezena da Silva, baseou-se no conceito de “perda de uma chance”, pois a empresa custeou um curso nos Estados Unidos e alimentou expectativas de contratação, mas optou por admitir outro profissional.

Piloto pediu demissão e participou de curso nos EUA

O piloto relatou na ação trabalhista que, em abril de 2017, recebeu um convite do presidente do conselho da Aguassanta para trabalhar na empresa, com salário de R$ 57 mil, como comandante de um jato executivo Falcon 7X. No mês seguinte, ele pediu demissão do local em que trabalhava havia dois anos para fazer o curso de qualificação nos Estados Unidos, de cerca de um mês de duração. Todo o valor foi custeado pela Aguassanta.

Ao terminar o curso, em que foi aprovado com louvor, foi orientado a esperar para ser chamado e participou de várias reuniões na empresa. De julho a setembro daquele ano, ele recebeu a remuneração combinada, como pessoa jurídica. Em outubro, foi informado que o presidente da empresa havia mudado de ideia e manteria a mesma tripulação. 

A empresa, em sua defesa, sustentou que não houve promessa de emprego, mas prestação de serviços entre duas pessoas jurídicas. Para a Aguassanta, o fato de ter custeado o curso não implica a promessa de contratação

O juízo de primeiro grau condenou a holding a indenizar o piloto, e a sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP). O TRT destacou que a empresa tinha ciência de que o piloto estava empregado em outra companhia e, mesmo assim, incentivou sua saída, causando frustração profissional e emocional.

Promessa de contratação foi quebrada

O ministro Dezena da Silva, relator do recurso de revista da holding no TST, ressaltou que os elementos registrados pelo TRT revelam que a quebra da promessa de contratação gerou prejuízos psicológicos e financeiros ao piloto, caracterizando o dano moral. Testemunhas confirmaram que, depois de meses de espera, a empresa contratou outro profissional. Além disso, o Tribunal afastou o argumento da defesa de que a contratação ocorreria por meio de uma empresa prestadora de serviços, reforçando que o vínculo seria mesmo de emprego.

A decisão foi por maioria, com divergência parcial do ministro Amaury Rodrigues, que concordou com a condenação, mas considerou o valor da indenização excessivo.

Enfermeiro é demitido por deixar chupeta presa com esparadrapo na boca de bebê

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho não aceitou recurso de um enfermeiro que pretendia reverter sua dispensa por justa causa da Fundação Universitária de Cardiologia, de Porto Alegre (RS). O motivo foi que, no seu plantão, duas empregadas prenderam a chupeta na boca de um bebê de quatro meses na UTI pediátrica com fita adesiva, e ele a manteve. Para o colegiado, a conduta foi grave, pois gerou riscos à saúde da criança, inclusive de morte. 

Bebê passou toda a noite com a chupeta

Na ação, o enfermeiro, admitido em 2017 e dispensado em 2019, disse que foi penalizado sem ter praticado nenhuma infração disciplinar ou falta grave. 

O hospital, em sua defesa, relatou que, em 7/8/2019, após a troca de plantão, funcionárias do turno da manhã constataram a chupeta presa na boca do bebê com micropore. Filmagens revelaram que duas funcionárias haviam tomado a medida. A chupeta ficou na boca do bebê por todo o plantão noturno e só era tirada para aspiração orofaríngea. O enfermeiro, por sua vez, responsável pela escala, visitou o paciente e manteve a fixação do bico. Todos os envolvidos foram demitidos.

Para o hospital, o procedimento foi “absolutamente inapropriado do ponto de vista técnico”, porque a obstrução da boca poderia ocasionar aspiração de vômito ou impedir a respiração pela boca, caso a traqueostomia fosse obstruída, levando o bebê a uma parada respiratória.

Situação causou risco de morte

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região mantiveram a punição, ressaltando que o enfermeiro era o responsável pelo setor na noite do procedimento e que o hospital conseguiu comprovar os motivos que justificaram a dispensa. Para o TRT, a penalidade foi proporcional à gravidade dos fatos.

O ministro Hugo Scheuermann, relator do agravo pelo qual o profissional pretendia rever o caso no TST, destacou que a fixação da chupeta com micropore num bebê internado em UTI pediátrica apresenta diversos riscos à saúde, inclusive de morte. “Se a tentativa era aliviar o estresse do paciente, a atitude foi errada, pois tinha muito mais risco à saúde da criança de quatro meses”, afirmou.  

Na avaliação do relator, o enquadramento jurídico da conduta do enfermeiro como mau procedimento foi apropriado e proporcional à falta cometida por ele.

A decisão foi unânime. 

Tribunal Superior do Trabalho

Falta de vínculo de socioafetividade leva Terceira Turma a manter desconstituição de paternidade

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a desconstituição da paternidade requerida por um rapaz, para que constem em seu registro de nascimento apenas os nomes de sua mãe e dos avós maternos, bem como sejam extintos os deveres recíprocos – como os de natureza patrimonial e sucessória.

“Constatada a inexistência de vínculo de socioafetividade entre o autor e seu genitor, bem como evidenciada a quebra dos deveres de cuidado do pai registral, consubstanciado no abandono material e afetivo do filho, verifica-se a possibilidade de rompimento do vínculo de paternidade, ante o descumprimento do princípio constitucional da paternidade responsável”, declarou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

A ação de desconstituição da paternidade foi ajuizada sob o fundamento de que o rapaz – atualmente com 25 anos – sofreu abandono afetivo e material, bem como foi alvo de estigmatização devido a um crime cometido por seu pai. Devido ao bullying que sofria em razão do sobrenome do pai, ele precisou trocar diversas vezes de escola. Em 2009, sete anos após o crime, foi autorizado judicialmente a suprimir o sobrenome paterno, passando a utilizar apenas o sobrenome da mãe.

Depois que, em primeira e segunda instâncias, a Justiça autorizou o rompimento do vínculo de paternidade, o pai recorreu ao STJ, sob o argumento de que o crime pelo qual foi condenado não deveria impedir o exercício da paternidade.

Ausência de socioafetividade pode levar ao rompimento do vínculo de filiação

Segundo o processo, após a separação dos pais, quando tinha poucos meses de idade, o menino passou a morar com a mãe e os avós maternos em outra cidade. Pelo período de alguns meses, quando ele tinha um ano, seus pais voltaram a conviver, mas se separaram novamente.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, o filho teve apenas mais um contato com o genitor, ao visitá-lo quando estava preso. Mesmo depois de voltar à liberdade – observou a relatora –, o pai não procurou o filho.

A ministra mencionou decisões do STJ baseadas em uma concepção de família que não tem mais seu fundamento apenas no vínculo biológico, mas também na socioafetividade como igual fonte de parentesco. “Se a presença de socioafetividade autoriza o reconhecimento de vínculo de filiação, é possível compreender que a sua ausência implicaria o seu rompimento”, comentou.

Quebra dos deveres de cuidado do genitor com o filho

De acordo com a relatora, o princípio da responsabilidade parental tem como base os deveres da família previstos nos artigos 227 a 229 da Constituição Federal, que determina aos pais a obrigação de assistir, criar e educar os filhos menores, assim como os maiores têm o dever de amparar os genitores na velhice, na carência ou na enfermidade.

No caso em análise, a ministra ponderou que pai e filho se encontraram em raras oportunidades ao longo da vida do rapaz, mesmo antes da prisão. Na sua avaliação, os depoimentos colhidos no processo evidenciam “a ausência de estabelecimento de vínculo de socioafetividade entre o pai registral e o filho, seja por causa da pouca convivência entre eles, seja por causa da ausência de afeto e, até mesmo, de certa repulsa sentida pelo filho em razão do crime cometido pelo pai e das consequências causadas em sua infância e juventude”.

O cometimento do crime, por si só, não acarretaria o rompimento da filiação – ressaltou a ministra –, mas “a ausência de socioafetividade estabelecida ao longo de 25 anos demonstra a quebra dos deveres de cuidado do genitor para com o filho, ensejando seu abandono material e afetivo”.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Reconhecimento de maus-tratos impõe manutenção de decisão que determinou abrigamento de idosa

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) denegou habeas corpus impetrado contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que manteve a internação de uma idosa em abrigo, após denúncia de maus-tratos feita contra o seu filho pelo Centro de Referência de Assistência Social (Cras) da região.

O filho da idosa buscou o STJ depois que a relatora de outro habeas corpus no TJMG indeferiu a liminar. Ele argumentou que não haveria justificativa ou fundamento legal para manter sua mãe internada e que todo o procedimento ocorreu de forma extrajudicial, sem qualquer intervenção de um magistrado competente.

Ao analisar o caso, a relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que a Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal (STF) impede o exame de habeas corpus contra decisão monocrática de relator que negou a liminar na instância anterior, sem ter havido ainda o julgamento de mérito do pedido – segundo ela, uma forma de evitar a indevida supressão de instância. Todavia, a ministra ressalvou que, nas hipóteses de flagrante ilegalidade ou teratologia, o entendimento da súmula pode ser superado e a ordem concedida de ofício.

Condição de vulnerabilidade exige medida extrema

Nancy Andrighi reconheceu que, conforme a posição adotada pela Segunda Turma no julgamento do REsp 1.680.686, o abrigamento de pessoa idosa somente é admitido em último caso, quando outras ações protetivas se mostrarem insuficientes para lhe garantir saúde e integridade física e mental.

No caso, entretanto, ela apontou que “o parecer técnico descreveu a situação de extrema vulnerabilidade da paciente, submetida a condições insalubres e ausência de cuidados essenciais, com grave risco à sua integridade física e emocional”.

A relatora afastou a hipótese de flagrante ilegalidade e destacou que, diante das informações prestadas pelos órgãos envolvidos, o abrigamento se mostra de acordo com os artigos 43 e 45, inciso V, do Estatuto da Pessoa Idosa.

Por fim, a ministra observou que, durante o processo, a irmã da idosa entrou em contato com o abrigo para solicitar informações e manifestou seu interesse em requerer a curatela. Sabendo disso, a relatora salientou a importância “da adoção, com a maior brevidade possível, das medidas necessárias à promoção do retorno da paciente à convivência familiar, como lhe assegura o artigo 3º, caput e parágrafo 1º, inciso V, do Estatuto da Pessoa Idosa“.

Acórdão no HC 957.725.

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Empresas de cruzeiro são condenadas por exigir teste de HIV e drogas de animadora infantil

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Costa Cruzeiros Agência Marítima e Turismo Ltda. e a Ibero Cruzeiros Ltda. a indenizar uma animadora infantil que trabalhou em cruzeiros de navio, por ter exigido exames de HIV e toxicológico na admissão. Para o colegiado, a exigência, além das humilhações da empregada em ambiente público, caracterizam abuso de direito.

Exames e certidões foram exigidos para a contratação

A profissional trabalhou nos navios das empresas de junho de 2016 a janeiro de 2017. Na reclamação trabalhista, acusou os empregadores de violar direitos trabalhistas ao exigir os exames e comprovantes de antecedentes criminais sem que a atividade tivesse alguma peculiaridade que justificasse a medida. 

Além disso, relatou que era constantemente ofendida por seu chefe, com expressões que revelavam preconceito de gênero, como “biscate, prostituta, vagabunda, idiota”. Tudo isso na presença de tripulantes e passageiros, inclusive crianças. Ela reportou a situação à empresa, mas nada foi feito.

Para TRT, exigência era justificada

O juízo de primeiro grau rejeitou os pedidos de indenização. No entanto, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) reformou a sentença e condenou as empresas pelo assédio. A decisão levou em conta o depoimento de uma testemunha, também animadora, que confirmou a conduta do chefe e fixou a condenação em R$ 2 mil. 

Porém, a indenização pela exigência dos exames foi negada. Para o TRT, as empresas teriam justificado a medida não pela função da animadora, mas pela peculiaridade da atividade a bordo de navios em cruzeiros marítimos. Como toda a tripulação tinha de se submeter a esses exames, o TRT julgou justificada a conduta, que atenderia ao princípio da preservação da saúde.

Relator destaca estigmatização de pessoas com HIV

Ao examinar recurso da trabalhadora quanto à exigência dos exames admissionais de HIV e toxicológicos, o relator, ministro Mauricio Godinho Delgado, salientou que a Lei 9.029/1995 proíbe a prática discriminatória e limitativa de acesso ao trabalho. A Portaria 1.246/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego também proíbe a testagem quanto ao HIV. 

Na avaliação do ministro, a exigência do teste decorre da estigmatização do portador do vírus HIV. Por isso, a medida caracteriza discriminação e abuso de direito do empregador e afronta a intimidade, a vida privada e a dignidade da trabalhadora. Para esse aspecto, foi deferida indenização de R$ 10 mil. 

Caso também envolve violência e assédio contra mulher

Com relação ao assédio, o ministro destacou a importância da matéria, que envolve violência contra mulheres no ambiente do trabalho. Ele ressaltou a evolução da legislação nacional e internacional sobre o tema e citou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e normas internacionais que buscam evitar que os julgamentos repitam estereótipos e perpetuem tratamentos diferentes e injustos contra mulheres.

O ministro apontou, entre outros elementos que compõem o assédio moral sofrido pela animadora, a discriminação específica em razão da sua condição de mulher e o fato de o ofensor exercer cargo de chefia, além do notório desnível entre o poder econômico dela e das empresas e a condição pública e reiterada das humilhações. A seu ver, tudo isso demonstra a desproporcionalidade da indenização deferida pelo TRT, que foi elevada para R$ 30 mil.

Segundo o relator, a manutenção de valores ínfimos, especialmente em casos de violência moral e preconceito vigorantes há séculos no país, contribuiria para a naturalização da conduta ilícita.  

A decisão foi unânime.

(Lourdes Tavares/CF)

Processo: RRAg-2030-90.2017.5.09.0016

Tribunal Superior do Trabalho

Justiça mantém condenação de produtora de evento por cancelamento de show internacional

A 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal condenou a T4F Entretenimento S/A a indenizar consumidora pelo cancelamento de um show internacional devido a condições climáticas adversas. O cancelamento ocorreu minutos antes do início da apresentaçãoquando o público já estava presente no local.

De acordo com o processo, a consumidora havia adquirido ingressos para um espetáculo, no Rio de Janeiro, e viajou com sua filha para assistir à apresentação. No entanto, apesar dos alertas sobre a intensa onda de calor que atingia a cidade, o evento foi cancelado apenas minutos antes de seu início, quando o público já se encontrava no local.

No recurso, a ré argumentou que o cancelamento foi motivado por força maior, o que caracteriza fortuito externo, capaz de afastar a sua de responsabilidade civil. Alegou ainda que não poderia ser obrigada a arcar com despesas que não fizeram parte da relação contratual e que a situação não ultrapassaria o mero aborrecimento, o que afastaria a necessidade de indenização por danos morais.

A Turma Recursal, no entanto, rejeitou os argumentos da empresa. Segundo a decisão, as condições climáticas eram previsíveis e amplamente divulgadas pelos meios de comunicação, o que permitia à organização adotar medidas preventivas. Para o colegiado, o cancelamento do evento em momento inoportuno configura falha na prestação do serviço e, nesses casos, a responsabilidade da empresa é objetiva, ou seja, independe da comprovação de culpa.

Por fim, o Juiz relator enfatizou que os prejuízos financeiros da consumidora foram devidamente comprovados, uma vez que os gastos com passagem e hospedagem “foram realizadas exclusivamente em função do evento programado”. Assim, “ficou comprovada a frustração resultante da legítima expectativa criada pela recorrida quanto à realização do show de uma renomada cantora internacional, em outro estado brasileiro. A recorrida efetuou consideráveis despesas para comparecer ao evento, que não ocorreu na data marcada devido à falha na organização”, declarou a autoridade judicial.

Dessa forma, a empresa foi condenada a restituir R$ 5.578,07 a título de danos materiais e a pagar R$ 3 mil, por danos morais.

Processo: 0720880-15.2024.8.07.0016

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios